Explicaê

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TEXTO I

 

MAIS QUE ORWELL, HUXLEY PREVIU NOSSO TEMPO

Hélio Gurovitz

    Publicado em 1948, o livro 1984, de George Orwell,

saltou para o topo da lista dos mais vendidos (...) A

distopia de Orwel, mesmo situada no futuro, tinha um

endereço certo em seu tempo: o stalinismo. (...) O

[5] mundo da “pós-verdade”, dos “fatos alternativos” e da

anestesia intelectual nas redes sociais mais parece outra

distopia, publicada em 1932: Admirável mundo novo, de

Aldous Huxley.

    Não se trata de uma tese nova. Ela foi levantada

[10] pela primeira vez em 1985, num livreto do teórico da

comunicação americano Neil Postman: Amusing

ourselves to death (Nos divertindo até morrer),

relembrado por seu filho Andrew em artigo recente no

The Guardian. “Na visão de Huxley, não é necessário

[15] nenhum Grande Irmão para despojar a população de

autonomia, maturidade ou história”, escreveu Postman.

“Ela acabaria amando sua opressão, adorando as

tecnologias que destroem sua capacidade de pensar.

Orwell temia aqueles que proibiriam os livros. Huxley

[20] temia que não haveria motivo para proibir um livro, pois

não haveria ninguém que quisesse lê-los. Orwell temia

aqueles que nos privariam de informação. Huxley,

aqueles que nos dariam tanta que seríamos reduzidos à

passividade e ao egoísmo. Orwell temia que a verdade

[25] fosse escondida de nós. Huxley, que fosse afogada num

mar de irrelevância.”

    No futuro pintado por Huxley, (...) não há mães,

pais ou casamentos. O sexo é livre. A diversão está

disponível na forma de jogos esportivos, cinema

[30] multissensorial e de uma droga que garante o bem-estar

sem efeito colateral: o soma. Restaram na Terra dez

áreas civilizadas e uns poucos territórios selvagens,

onde grupos nativos ainda preservam costumes e

tradições primitivos, como família ou religião. “O mundo

[35] agora é estável”, diz um líder civilizado. “As pessoas

são felizes, têm o que desejam e nunca desejam o que

não podem ter. Sentem-se bem, estão em segurança;

nunca adoecem; não têm medo da morte; vivem na

ditosa ignorância da paixão e da velhice; não se acham

[40] sobrecarregadas de pais e mães; não têm esposas, nem

filhos, nem amantes por quem possam sofrer emoções

violentas; são condicionadas de tal modo que

praticamente não podem deixar de se portar como

devem. E se, por acaso, alguma coisa andar mal, há o

[45] soma.”

    Para chegar à estabilidade absoluta, foi

necessário abrir mão da arte e da ciência. “A felicidade

universal mantém as engrenagens em funcionamento

regular; a verdade e a beleza são incapazes de fazê-lo”,

[50] diz o líder. “Cada vez que as massas tomavam o poder

público, era a felicidade, mais que a verdade e a beleza,

o que importava.” A verdade é considerada uma

ameaça; a ciência e a arte, perigos públicos. Mas não é

necessário esforço totalitário para controlá-las. Todos

[55] aceitam de bom grado, fazem “qualquer sacrifício em

troca de uma vida sossegada” e de sua dose diária de

soma. “Não foi muito bom para a verdade, sem dúvida.

Mas foi excelente para a felicidade.”

    No universo de Orwell, a população é controlada

[60] pela dor. No de Huxley, pelo prazer. “Orwell temia que

nossa ruína seria causada pelo que odiamos. Huxley,

pelo que amamos”, escreve Postman. Só precisa haver

censura, diz ele, se os tiranos acreditam que o público

sabe a diferença entre discurso sério e entretenimento.

[65] (...) O alvo de Postman, em seu tempo, era a televisão,

que ele julgava ter imposto uma cultura fragmentada e

superficial, incapaz de manter com a verdade a relação

reflexiva e racional da palavra impressa. O computador

só engatinhava, e Postman mal poderia prever como

[70] celulares, tablets e redes sociais se tornariam  bem

mais que a TV - o soma contemporâneo. Mas suas

palavras foram prescientes: “O que afligia a população

em Admirável mundo novo não é que estivessem rindo

em vez de pensar, mas que não sabiam do que estavam

[75] rindo, nem tinham parado de pensar”.

(Adaptado, Revista Época nº 973 – 13 de fevereiro de 2017, p.67)

 

Distopia = Pensamento, filosofia ou processo discursivo caracterizado pelo totalitarismo, autoritarismo e opressivo controle da sociedade, representando a antítese de utopia. 

(BECHARA, E. Dicionário da língua portuguesa. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2011, p.533)


Assinale a alternativa que apresenta o principal objetivo comunicativo do emissor do texto.


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