[...] Na escola especial que ele frequenta todos os dias, um paciente e talentoso professor de arte cria números surpreendentes de teatro com aquele grupo de crianças díspares. Uma das peças é uma versão simplificada da Comédia dos erros. Uma concepção original: em cena, as crianças dublam a própria voz, previamente gravada em trechos isolados que depois são montados na mesma sequência. Assim, cada uma das frases avulsas do texto, penosamente praticadas pelas crianças e depois gravadas em sequência, são o pano de fundo de uma deliciosa e ingênua pantomima, que elas levam a cabo com comovente dedicação e eficiência. As crianças jamais seriam capazes de memorizar aquelas falas mais longas – e alguns deles, como o seu menino, sequer conseguiriam dizer naturalmente uma frase completa com uma oração subordinada e uma coordenada em sequência (a única estrutura de que ele dá conta no seu dia é o conjunto básico sujeito-predicado, nessa ordem, e jamais em voz passiva.).
TEZZA, C. O filho eterno. Rio de Janeiro: Record, 2009.
O fragmento descreve o processo de organização das peças teatrais encenadas pelas crianças especiais. Nessa descrição, o narrador em terceira pessoa apresenta a cena empregando certo distanciamento da esfera emocional, que permite entrever uma abordagem que evidencia