Singular ocorrência
- Há ocorrências bem singulares. Está vendo aquela dama que vai entrando na igreja da Cruz? Parou agora no adro para dar uma esmola.
- De preto?
- Justamente; lá vai entrando; entrou.
- Não ponha mais na carta. Esse olhar está dizendo que a dama é uma recordação de outro tempo, e não há de ser muito tempo, a julgar pelo corpo: é moça de truz.
- Deve ter quarenta e seis anos.
- Ah! Conservada. Vamos lá; deixe de olhar para o chão e conte-me tudo. Está viúva, naturalmente?
- Não.
- Bem; o marido ainda vive. É velho?
- Não é casada.
- Solteira?
- Assim, assim. Deve chamar-se hoje D. Maria de tal. Em 1860 florescia com o nome familiar de Marocas. Não era costureira, nem proprietária, nem mestra de meninas; vá excluindo as profissões e chegará lá. Morava na Rua do Sacramento. Já então era esbelta, e, seguramente, mais linda do que hoje; modos sérios, linguagem limpa;
ASSIS, M. Machado de Assis: seus 30 melhores contos. Rio de Janeiro: Aguilar, 1961.
No diálogo, descortinam-se aspectos da condição da mulher em meados do século XIX. O ponto de vista dos personagens manifesta conceitos segundo os quais a mulher