Explicaê

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TEXTO I

 

Porta de colégio 

 

[1]   Passando pela porta de um colégio, me veio  

a sensação nítida de que aquilo era a porta da  

própria vida. Banal, direis. Mas a sensação era  

tocante. Por isso, parei, como se precisasse ver  

[5] melhor o que via e previa. 

  Primeiro há uma diferença de clima entre  

aquele bando de adolescentes espalhados pela  

calçada, sentados sobre carros, em torno de  

carrocinhas de doces e refrigerantes, e aqueles  

[10] que transitam pela rua. Não é só o uniforme.  

Não é só a idade. É toda uma atmosfera, como  

se estivessem ainda dentro de uma redoma ou  

aquário, numa bolha, resguardados do mundo.  

Talvez não estejam. Vários já sofreram a  

[15] pancada da separação dos pais. Aprenderam  

que a vida é também um exercício de  

separação. Um ou outro já transou droga, e  

com isso deve ter se sentido  

(equivocadamente) muito adulto. Mas há uma  

[20] sensação de pureza angelical misturada com  

palpitação sexual, que se exibe nos gestos  

sedutores dos adolescentes. 

  Onde estarão esses meninos e meninas  

dentro de dez ou vinte anos? 

[25]   Aquele ali, moreno, de cabelos longos  

corridos, que parece gostar de esporte, vai se 

interessar pela informática ou economia;  

aquela de cabelos louros e crespos vai ser dona  

de boutique; aquela morena de cabelos lisos  

[30] quer ser médica; a gorduchinha vai acabar  

casando com um gerente de multinacional;  

aquela esguia, meio bailarina, achará um  

diplomata. Algumas estudarão Letras, se  

casarão, largarão tudo e passarão parte do dia  

[35] levando filhos à praia e à praça e pegando-os  

de novo à tardinha no colégio. [...] 

  Estou olhando aquele bando de adolescentes  

com evidente ternura. Pudesse passava a mão  

nos seus cabelos e contava-lhes as últimas  

[40] histórias da carochinha antes que o lobo feroz  

as assaltasse na esquina. Pudesse lhes diria  

daqui: aproveitem enquanto estão no aquário e  

na redoma, enquanto estão na porta da vida e  

do colégio. O destino também passa por aí. E a  

[45] gente pode às vezes modificá-lo. 

SANT’ANNA, Affonso Romano de. Affonso Romano de Sant’Anna: seleção e prefácio de Letícia Malard. Coleção Melhores Crônicas. p. 64-66.

 

Entre as linhas 6 e 10 da crônica, existe um caso de concordância verbal curioso: “Primeiro há uma diferença de clima entre aquele bando de adolescentes espalhados pela calçada, sentados sobre carros, em torno de carrocinhas de doces e refrigerantes, e aqueles que transitam pela rua”. No trecho “aquele bando de adolescentes espalhados pela calçada, sentados sobre carros”, há um sintagma nominal cujo núcleo é bando, um substantivo coletivo que vem seguido de uma expressão no plural que o especifica: de adolescentes.

 

Observe o que é dito a seguir.

 

I. Em casos como esse, a regra geral da gramática normativa é a seguinte: com o substantivo coletivo, a concordância se faz no singular. Por essa ótica, no texto, deveríamos ter a seguinte estrutura: aquele bando de adolescentes espalhado pela calçada e sentado sobre carros.

II. A gramática faculta a seguinte possibilidade: se o coletivo vier seguido de uma expressão no plural que o especifique, o adjetivo ou o particípio que forma essa expressão pode ir para o plural ou ficar no singular: aquele bando de adolescentes espalhados pela calçada, sentados sobre carros.

III. Empregar o singular ou o plural nesses casos fica a critério do usuário da língua. Esses dois tipos de concordância variam livremente, independente de possíveis motivações.

 

Está correto o que se afirma em:

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