Dois velhinhos Dois pobres inválidos, bem velhinhos, esquecidos numa cela de asilo. Ao lado da janela, retorcendo os aleijões e esticando a cabeça, apenas um podia olhar lá fora. Junto à porta, no fundo da cama, o outro espiava a parede úmida, o crucifixo negro, as moscas no fio de luz. Com inveja, perguntava o que acontecia. Deslumbrado, anunciava o primeiro: – Um cachorro ergue a perninha no poste. Mais tarde: – Uma menina de vestido branco pulando corda. Ou ainda: – Agora é um enterro de luxo. Sem nada ver, o amigo remordia-se no seu canto. O mais velho acabou morrendo, para alegria do segundo, instalado afinal debaixo da janela. Não dormiu, antegozando a manhã. Bem desconfiava que o outro não revelava tudo. Cochilou um instante – era dia. Sentou-se na cama, com dores espichou o pescoço: entre os muros em ruína, ali no beco, um monte de lixo. TREVISAN, Dalton. Mistérios de Curitiba. Editora Record. Rio de Janeiro: 1979. p. 110.
O conto se caracteriza por apresentar um enredo curto, embora muitas vezes mantenha, na íntegra, a estrutura da narrativa: apresentação, complicação, clímax e desfecho. Nesse conto, o clímax ocorre quando o personagem