Santo do Pau Oco
Não tinha nome, ou se o tivera já se esquecera dele. E ninguém lhe deu outro. Chamavam-no de diversas maneiras: o Santo, o Aluado, o Madeirinha, o Oco do Pau.
Esse último apelido tinha como causa a resposta que ele sempre dava, fosse qual fosse o assunto: “Tudo bem no oco do pau”. Porque morava no interior de uma oiticica de raízes enormes e expostas – cavidade tão grande que um homem podia deitar-se lá dentro. Era o que ele fazia, gabando as comodidades: “No oco do pau não chove. É lugar fresco, protegido do vento, e eu o conservo muito limpinho”.
Não dizia muita coisa além disso. Quase não vinha à cidade e alimentava-se da natureza. Começaram a dizer que fazia milagres. Teve que fazê-los, mas isso o aborrecia muito. Não queria a entrada de sua casa de buraco repleta de gente. Nem tudo agora ia bem no oco do pau.
Para defender-se, treinou uma cobra inofensiva e colocou-a na defesa de sua intimidade. Os crentes não se atemorizavam com sua presença, e ela mordia de leve, sem envenenar ninguém. Acabou sendo considerada anjo porteiro do oco do pau.
O Madeirinha mudou-se e ninguém mais o viu.
ANDRADE, Carlos Drummond de. “Santo do Pau Oco”. In: Contos Plausíveis. Rio de Janeiro: José Olympio, 1985.
Vocabulário:
Oiticica – tipo de árvore.
O conflito é desencadeado na narrativa porque: