Agosto 1964
[1] Entre lojas de flores e de sapatos, bares,
mercados, butiques
viajo
[4] num ônibus Estrada de Ferro – Leblon
Volto do trabalho, a noite em meio,
fatigado de mentiras.
[7] O ônibus sacoleja. Adeus, Rimbaud,
relógio de lilases, concretismo,
neoconcretismo, ficções de juventude, adeus,
[10] que a vida
eu a compro à vista aos donos do mundo.
Ao peso dos impostos, o verso sufoca,
[13] a poesia agora responde a inquérito policial-militar.
Digo adeus à ilusão
mas não ao mundo. Mas não à vida,
[16] meu reduto e meu reino.
Do salário injusto,
da punição injusta,
[19] da humilhação, da tortura,
do terror,
retiramos algo e com ele construímos um artefato
[22] um poema
uma bandeira.
Ferreira Gullar. Dentro da noite veloz. In: Toda poesia. Rio de Janeiro: José Olympio, 2000.
Depois de 21 anos de regime militar, o Brasil finalmente teria um presidente civil. O político mineiro Tancredo Neves vencera Paulo Maluf no Colégio Eleitoral e assumiria o poder no dia 15 de março de 1985. No entanto, um dia antes da posse, com fortes dores abdominais, ele teve que ser internado no Hospital de Base, em Brasília. Após sete cirurgias, Tancredo morreu em 21 de abril, deixando a nação em choque.
Douglas Attila Marcelino. A despedida de um mártir. In: Revista de História da Biblioteca Nacional, março/2010, p. 58 (com adaptações).
Considerando o poema e o texto acima como referências iniciais e os aspectos marcantes da história da política brasileira da segunda metade do século XX, julgue:
Em larga medida, os coronéis de 1954, atuantes na conjuntura de crise pronunciada que levou Getúlio Vargas ao suicídio, serão os generais de 1964 à frente do golpe de Estado que depôs o presidente Jango. Nessa ruptura institucional, é possível identificar um viés inequivocamente oposicionista ao trabalhismo de Vargas, Goulart e Brizola.