Explicaê

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 Poéticas visuais

 

Notas De Pesquisa Sobre Poéticas Visuais

por Vera Casa Nova

 

“Que direções podem tomar as escrituras? Todas as direções.”

                                                                  Roland Barthes

Invenções, fricções e experimentalismos são os fios que movem essa máquina do poema visual, na contemporaneidade. Poética cujo impacto estético decorre da forma utilizada, da configuração das letras no espaço da página ou de qualquer outro suporte que a suplemente. 

Ora Concreto, Práxis, Semiótico, ora Processo ou que conceito ou nome tenham em seu movimento, é o poema, sua palavra, sua imagem, seu verso, em sua visualidade e mesmo em sua tactilidade, que se tocam, se friccionam, mostrando as infinitas tramas linguageiras do poético entre as artes, nos espaços inter/intra semióticos. 

A letra como traço, o traço como letra – “a letra sentida como escrita. A letra vista como sentido” (Escrita para o Emerenciano, E.M. de Melo e Castro. In: Finitos mais finitos) (1), ou ainda a letra sentida como não-letra e o olho perscrutando o espaço da página, ou no ambiente cibernético.

Se há imagens nos ideogramas, há também sob e nas palavras. E isso Mallarmé parece ter nos mostrado em seu poema Um Lance de dados e Apollinaire, em Caligramas, ratificado, para citarmos somente aqueles que são homenageados pelos poetas que exercitam a visualidade da palavra/verso.

Não inventaram, renovaram talvez. Os séculos XVI e XVII na Alemanha, em pleno Barroco, apresentaram poemas figurados, palíndromos e jogos de linguagem. O militante Martin Opitz chamou a atenção de seus contemporâneos quando propôs uma desvalorização da palavra poética e sua revalorização pelo viés da poesia visual. Segundo Jêrome Peignot, o “retorno da imagem escrita a qual assistimos hoje prova que nos encontramos numa situação semelhante a que denunciava Opitz”. (2)

A história das palavras-imagens vai longe. Mas vale lembrar alguns momentos como o Dada de Kurt Shwitters, de Hugo Ball, Max Ernest, Duchamp, F. Picabia e Hans Harp, em que a letra na tela fazia seu percurso de imagem. O poeta Carlo Belloli, que em 1943 estreava seus poemas murais. Ou entre os nossos poetas, o Caderno de Poesia, de Oswald de Andrade, sentimos as novas tendências, desenhando ao lado de seu poema.

Mas a palavra-imagem reinicia seu caminho na década de 1950, com Gomringer (Konstellationem), antologia editada na Suíça, que traz poemas visuais com ressonâncias mallarmaicas, chamados de “poemas concretos”. 

Na mesma época o grupo Noigrandes (1956), de Augusto de Haroldo de Campos e Décio Pignatari, faz sua aparição no cenário literário carioca e paulista. A eles se juntam Wlademir Dias Pino – Poema Processo – uma partilha, inicialmente, sensível (3), que envolvia questões poéticas, estéticas e políticas, logo a seguir marcadas pelo desencontro.

Na superfície plana da página, mudando a função da letra e da imagem, a poética verbo-vocovisual proposta pelo Concretismo paulista simultaneamente faria jogo com os entrelaces da tipografia do Poema Processo, que da visualidade extrairia o háptico, conforme podemos ver nos dois livros-objetos Ave e Sólida de W. Dias Pino, ou ainda nos poemas- Móbiles de Julio Plaza e Augusto de Campos.

Imagem

Verdadeiros ideogramas projetados. Ronaldo Azeredo brincava com as letras desenhando figurações.

 

A mão e o olho do leitor entrariam em conexão para apreender as disjunções. A “anti-representação” inscrevia-se num contexto em que as artes propunham transformação, via pequenos ou grandes riscos, censuras, dobras deslocamentos.

O plano da superfície dos signos escritos conecta-se com o plano da superfície dos signos tipográficos. As interfaces são criadas entre suportes diferentes e estes suplementam-se ou friccionam-se, a ponto de fazerem da letra um design ubíquo que permeia outras e diversas atividades e exercícios linguageiros. Os poemas visuais de Joan Brossa merecem destaque. Esse poeta realiza poemas-objeto que dialogam com o concretismo, tais como Poema-pistola (1969-1971), ou na supressão da palavra, tais como Luva-carta (1967) ou Sem sorte (1988).

 

Signos de interfaces, design de interfaces, campos de interações redimensionando a poética e a retórica, mutantes a pelo menos um século e meio. Sebastião Nunes brinca nos espaços tipográficos e fotográficos. Seus poemas visuais englobam a propaganda, lida às avessas. Valêncio Xavier recorta sua memória através de revistas de sua infância e adolescência.

Os fluxos do contemporâneo povoam a coisa litero-visual, “Novas tecnologias supõem novas imagens” (4) afirmou J. Plaza. Logo, para novas imagens, novas poéticas. Fusão do olho, da mão, da página, da tela. Ou mais: a música cageanamente intensa (o ouvido) implica a interface da página/tela, película/fotograma (o olho). Arnaldo Antunes, por exemplo, faz de seu Nome um outro movimento, um outro jogo – do livro ao disco, ao vídeo. A letra se movimenta. Se antes a letraset resolvia, hoje os programas do computador fazem a festa da linguagem. A escritura deixa o design, a habilidade do escritor em pintar, desenhar a palavra. No interior da linguagem encontros insólitos entre o fonético, a representação gráfica e o movimento das imagens e das palavras. Elipses, aliterações, assonâncias, “rébus”: números, palavras que representam por seu som palavras ou versos, tecnologicamente construídos pelo tecido intersemiótico. Ricardo Aleixo canta e dança seu poema-máquina pós-concreto, mas sobretudo verbovocovisual. Seu trabalho de poética sonora é múltiplo – voz, corpo, imagem.

Os poemas daquilo que se chama a videopoesia ou na experiência multimidiática do cdrom-poesia nos clip- poemas (1997) de Augusto de Campos ou ainda seus Clip- poemas (2003) como Rever, Poema Bomba, SOS, que podem ser vistos na tela do computador, são acontecimentos que desdobram o poético.

Não resta dúvida que se o processo de produção poética mudou, a leitura também. A retórica da leitura que nos obriga a ler em sequência horizontal, agora nos obriga a fazer outra leitura: a da óptica vertical.

http://www.cronopios.com.br/site/colunistas.asp?id=624

 

Converse com a turma sobre o caráter contemporâneo desse tema e a trajetória da poética visual no contexto histórico, sugira que pesquisem sobre o tema e peça para lerem o texto acima na íntegra, no endereço acima. Abra uma roda de discussão para que os alunos possam compartilhar o material pesquisado e depois do tema discutido, proponha aos alunos a criação de poemas visuais elaborados com auxílio das ferramentas de informática disponíveis no laboratório da escola, como Moviemaker, Flash, Powerpoint, etc.