(UERJ) Morro velho
No sertão da minha terra,
fazenda é o camarada que ao chão se deu.
Fez a obrigação com força,
parece até que tudo aquilo ali é seu.
Só poder sentar no morro e ver tudo verdinho,
lindo a crescer.
Orgulhoso camarada, de viola em vez de enxada.
Filho do branco e do preto,
correndo pela estrada atrás de passarinho.
Pela plantação adentro,
crescendo os dois meninos, sempre pequeninos.
Peixe bom dá no riacho de água tão limpinha,
dá pro fundo ver.
Orgulhoso camarada conta histórias pra moçada.
Filho do sinhô vai embora,
tempo de estudos na cidade grande.
Parte, tem os olhos tristes,
deixando o companheiro na estação distante.
“Não me esqueça, amigo, eu vou voltar.”
Some longe o trenzinho ao deus-dará.
Quando volta já é outro,
trouxe até sinhá-mocinha para apresentar.
Linda como a luz da lua
que em lugar nenhum rebrilha como lá.
Já tem nome de doutor
e agora na fazenda é quem vai mandar.
E seu velho camarada
já não brinca, mas trabalha.
MILTON NASCIMENTO
Adaptado de miltonnascimento.com.br.
A história da casa-grande é íntima de quase todo brasileiro: de sua vida doméstica, conjugal, sob o patriarcalismo escravocrata e polígamo; da sua vida de menino. Nas casas-grandes foi até hoje onde melhor se exprimiu o caráter brasileiro, a nossa continuidade social.
Adaptado de Freyre, G. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. Rio de Janeiro: Record, 1995.
Publicado em 1933, Casa-grande & senzala tornou-se livro de referência nas análises sobre patriarcalismo na sociedade brasileira. Na letra da canção Morro velho, aspectos das relações patriarcais são abordados, entre eles a “continuidade social”, presente na seguinte passagem: