Texto 3
O texto 3 é um recorte de uma entrevista concedida pelo escritor Sérgio Vaz, para o site “Brasil de Fato”. Vaz faz parte de um grupo de escritores que produz o que chamam Literatura Periférica. É também idealizador e coordenador do Sarau da Cooperifa (Cooperativa Cultural da Periferia). Esse sarau realiza-se há dez anos, toda quarta-feira, no bairro Piraporinha, zona sul de São Paulo.
Brasil de Fato — Qual sua intenção com
[35] livro Literatura, pão e poesia?
Sérgio Vaz — É [uma expressão da minha]
relação cotidiana com o meu bairro e com as
pessoas [com] que eu convivo. [A ideia é]
levar um pouco de literatura, falando dessas
[40] pessoas, que eu conheço muito bem. [...] A
ideia sempre foi escrever sobre meu
cotidiano. Eu me considero um cronista do
meu bairro. Então escrevo sobre o lugar onde
vivo. Não acho que eu seja um escritor
[45] universal, escrevo sobre o que eu vejo na
minha realidade.
É difícil publicar e fazer circular livros
que tratam do marginalizado?
Eu acho que hoje o difícil é você escrever um
[50] livro. O difícil mesmo é a distribuição, a
circulação. E é difícil quem leia também. Esse
país não é um país de leitores e não só na
periferia, mas na classe média e na classe
alta. É um país que não lê. O grande desafio
[55] da Cooperifa é fazer a formação de público
para a leitura.
Num futuro próximo, você pensa na
transformação dessa periferia ou você
acha que ainda falta muito para essa
[60] realidade ser mudada?
Falta muito. Não será a literatura que vai
salvar a periferia, mas o poder público
atuante. A arte tem o poder de
transformação pessoal, que pode fazer com
[65] que essas pessoas cobrem do poder público
aquilo que é devido, aquilo que é pago em
imposto, para que esse imposto retorne em
benefícios. Não sou tolo de achar que a
literatura pode salvar alguém nesse ponto. Eu
[70] acho que a literatura, a música, a arte de
forma geral, ela transforma as pessoas em
cidadãos. E são esses cidadãos que cobram
do governo a postura para que ele faça com
que a gente tenha esse benefício.
[75] Qual sua opinião sobre o atual
movimento dos trabalhadores da cultura
que recentemente ocuparam a Funarte
(Fundação Nacional de Arte) e fizeram
uma grande manifestação contra a arte
[80] como mercadoria?
É isso mesmo. O artista é esse. O artista tem
que ser o cara que é incomodado, indignado.
Ele tem que protestar. A arte não embala os
adormecidos, ela desperta. Agora, se o
[85] artista não despertar, como ele vai despertar
a pessoa que vê sua arte?
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A periferia não era para protestar, não era
para ter arte. Alguma coisa deu errado, né?
Hoje tem mais de cinquenta saraus
[90] acontecendo. Nós temos três anos de Cinema
na Laje [...] passamos documentários [a] que
jamais a nossa população iria ter acesso. E
nesses mais de 50 saraus na periferia é onde
as pessoas se apropriaram da literatura. Ou
[95] seja, para o status quo, alguma coisa deu
errado. Era pra gente não ter boa literatura,
era pra gente não ter boa educação, era pra
gente não ter bom cinema. E a gente faz
cinema e não passa O homem Aranha, não
[100] passa nada de Hollywood. Alguma coisa deu
errado dentro da concepção do Estado, da
elite, né?
Atentando-se para as respostas de Sérgio Vaz às questões que lhe são dirigidas na entrevista, pode-se inferir corretamente que, para ele, sua obra