Não interessa aqui discutir se cabe considerar a chegada dos europeus ao continente americano, 1 em 1492, como
descoberta, encontro ou o que seja: questão, no geral, mais esterilizante que produtiva. O fato é que, naquele ano, os europeus se
deram conta da existência de uma porção vasta de terra até então desconhecida e habitada por homens diferentes dos da Europa.
O navegador Cristóvão Colombo (1451-1506), responsável por viabilizar tal encontro, achou que estava chegando no Oriente: com
[5] base nas medidas adotadas pelo astrônomo árabe do século 9, Abu al-Farghani, calculou mal o tamanho do grau, unidade na qual
se dividia a esfera terrestre, e ainda errou ao converter a milha árabe para a milha italiana.
O grego Ptolomeu (90-168) e toda a escola de Alexandria lhe teriam servido melhor, mas se calculasse bem, o genovês
não teria chegado onde chegou. Mesmo porque a imaginação, encharcada de relatos sobre terras fantásticas e da obsessão por
monstros, o guiava tanto ou mais que o conhecimento ‘científico’. Encontrar tais monstros era fundamental, com a tradição
[10] rezando que sua presença augurava riquezas. Foi grande o desapontamento de Colombo quando os naturais das ilhas do Caribe
lhe disseram que nunca tinham visto tais seres. Conforme a realidade contradizia o que lhe ia pela cabeça, o navegador substituía
elementos: na falta dos súditos do Grande Cã, levou para a Espanha os ‘índios’ de Hispaniola; em vez das sedas e dos brocados,
exibiu aos reis católicos as máscaras estranhas e cintos feitos de osso de peixe; no lugar das presas de elefantes ou unicórnios,
ostentou papagaios verdes. [...]
[15] Ao longo do século 16, Colombo já morto, cresceu na Europa a consciência da magnitude das transformações
provocadas por aquelas terras novas, ignoradas pelos autores antigos e capazes de mostrar quanta coisa escapara a sua
sabedoria. O nome do Novo Mundo ainda flutuava, cada vez mais sendo identificado ao de outro navegador, o florentino Américo
Vespúcio (1454-1512). Ao léxico faltava capacidade para exprimir tanta coisa nova e estranha, daí recorrer-se primeiro ao que era
familiar e conhecido. As palavras não bastavam para um desesperançado Gonzalo de Oviedo descrever a plumagem brilhante dos
[20] pássaros americanos, nem para Jean de Léry contrastar o semblante dos tupinambás da costa brasílica, tão diferentes dos
europeus: quem quisesse “desfrutar do prazer de os conhecer”, afirmou este, teria de “visitá-los no seu país”. Ao dedicar sua
Historia General de Las Indias ao imperador Carlos V, em 1553, Francisco Gómara escreveu bombasticamente: “O maior
acontecimento desde a criação do mundo (excluindo a encarnação e a morte d’Aquele que o criou) foi a descoberta da Índia”.
(SOUZA, Laura de Mello. Colombo, a América e o Conhecimento. Ciência Hoje, julho 2011, p. 83.)
Segundo o texto, é correto afirmar: