O texto a seguir foi transcrito, parcialmente, do livro Contos de Shakespeare. Leia-o e resolva as questões
A FÚRIA DOMADA
Batista era o homem mais rico da cidade de Pádua, na Itália. Uma de suas filhas, apesar de muito bonita, era famosa por seu temperamento agressivo e pelo número espantoso de insultos que saíam de sua boca. Todos a conheciam pelo nome de Catarina, a Fúria.
Quem teria a coragem de casar-se com Catarina? Na cidade, ninguém acreditava que um tal doido aparecesse. O risco não pagava a pena.
Branca, a irmã mais moça de Catarina, era toda meiguice e boas maneiras. Mesmo assim, também ela estava arriscada a ficar solteira, pois o velho Batista fazia questão de casar em primeiro lugar a filha mais velha.
Foi quando chegou a Pádua um jovem, chamado Petrúquio, decidido a achar uma noiva. Ao ouvir falar do terrível temperamento de Catarina, o jovem mostrou-se interessado e declarou com visível satisfação:
— Ótimo! Vou transformar essa fúria indomável na esposa mais dócil que já existiu.
Embora a promessa fosse difícil de ser cumprida, Petrúquio tinha qualidades para tal: era muito obstinado; possuía um gênio expansivo e bem-humorado e parecia um ator de teatro, pela perfeição com que conseguia representar a mais assustadora das cóleras sem sequer estar com raiva.
Era o que se chamava hoje um cara-de-pau. Quando Petrúquio foi pedir licença a Batista, para namorar a “meiga Catarina”, teve a coragem de dizer ao velho que ouvira inúmeros elogios à “delicadeza” da moça.
Embora estivesse louco para ver a filha casada, o pai achou melhor confessar logo que o rapaz estava um pouco enganado. E já se dispunha a fazê-lo quando entrou na sala o professor de música todo assustado: Catarina acabara de quebrar-lhe a cabeça com o alaúde, um instrumento de corda muito usado antigamente.
— Só porque tentei corrigir-lhe uma nota errada!
Petrúquio sorriu, encantado:
— Que moça decidida! Eu a admiro ainda mais depois desse gesto! Não posso perder muito tempo, Sr. Batista. Tenho muito a resolver, com relação às minhas propriedades, e gostaria de saber logo qual é o meu dote, caso eu consiga conquistar o amor de Catarina.
Esses modos bruscos não combinavam bem com um rapaz apaixonado; mas, como queria ver a filha casada, Batista respondeu que o dote seria de vinte mil coroas. E o acordo foi prontamente realizado.
Batista saiu da sala para comunicar à terrível filha o contrato de casamento. Petrúquio ficou a imaginar os galanteios que diria à noiva. “Vou procurar surpreendê-la, assim que ela chegar. Se zombar de mim, digo-lhe que me faz lembrar um passarinho a cantar; se fizer cara feia, vou compará-la às rosas do amanhecer; se não disser nada, declaro-lhe que nunca ouvi palavras tão bonitas, e, se me disser que não a aborreça, mostrar-me-ei contentíssimo, como se tivesse me pedido para permanecer a seu lado uma semana.”
Ao entrar o furacão, disse Petrúquio:
— Bom dia, Cata...
Demonstrando não ter gostado da intimidade, a jovem respondeu com desdém:
— As pessoas que falam comigo me chamam de Catarina.
— Mentirosa — replicou o pretendente. — Todos dizem que teu nome é Cata; ou Cata, a Fúria. Seja como for, és a mais linda Cata do mundo. Tenho ouvido os maiores elogios à doçura de teu temperamento, e vim pedir-te em casamento.
Foi um encontro bem estranho, para dois noivos: enquanto com frequentes acessos de raiva ela revelava seu tempestuoso temperamento, ele não se cansava de elogiar-lhe a meiguice e a boa educação. Ao ouvir por fim os passos de Batista, — disse Petrúquio à moça:
—Vamos deixar de conversa, Catarina. Teu pai está de acordo: queiras ou não, serás minha mulher.
(...)
CAMPOS, Paulo Mendes. Contos de Shakespeare. 8ª ed. São Paulo: Ediouro, 2005. 72 p
O conto caracteriza-se também por apresentar e descrever seus personagens. Petrúquio, personagem do conto “Megera Domada”, foi caracterizado como “cara-de-pau”. De acordo com o texto, “cara-de-pau” significa pessoa atrevida, sem escrúpulos. A passagem do texto que comprova essa característica do personagem é