(ENEM 2009 2ªAPLICAÇÃO) Resolvo-me a contar, depois de muita hesitação, casos passados há dez anos — e, antes de começar, digo os motivos por que silenciei e por que me decido. Não conservo notas: algumas que tomei foram inutilizadas e, assim, com o decorrer do tempo, ia-me parecendo cada dia mais difícil, quase impossível, redigir esta narrativa. Além disso, julgando a matéria superior às minhas forças, esperei que outros mais aptos se ocupassem dela. Não vai aqui falsa modéstia, como adiante se verá. Também me afligiu a idéia de jogar no papel criaturas vivas, sem disfarces, com os nomes que têm no registro civil. Repugnava-me deformá-las, dar-lhes pseudônimo, fazer do livro uma espécie de romance; mas teria eu o direito de utilizá-las em história presumivelmente verdadeira? Que diriam elas se se vissem impressas, realizando atos esquecidos, repetindo palavras contestáveis e obliteradas?
RAMOS, Graciliano. Memórias do cárcere. Rio de Janeiro: Record, 2000, v.1, p. 33.
Em relação ao seu contexto literário e sócio-histórico, esse fragmento da obra Memórias do Cárcere, do escritor Graciliano Ramos,