Texto para a questão.
— O que é, mãe? — Acho muito divertido o que você e a Lia ficam fazendo lá na calçada — dona Dora sorriu, ajeitando os cabelos do filho, grudados no suor da testa. — Não é legal, mãe?! — Os olhos do Tico se acenderam de alegria. — Você já fez isso também, mãe? Ficar vendo as figuras que as nuvens formam no céu? — Já fiz isso muitas vezes, quando era pequena. Achava maravilhoso. Ainda acho! — dona Dora respondeu. — E a Lia, a sua amiguinha, parece gostar muito disso também, não é? — A Lia adora, mãe! Desde o primeiro dia que ela sentou comigo lá na calçada, nunca mais deixou de vir — o Tico disse. — Mas por que você está com essa cara triste, mãe? — Eu não estou triste, só estou achando um pouco estranho... — dona Dora começou a falar e parou, mexendo as mãos de nervoso. — É que... eu fiquei sabendo que a sua amiguinha, a Lia... — O que tem a Lia, mãe? — o Tico olhou fundo nos olhos dela. — A Lia não enxerga, Tico... Ela é cega. O Tico não disse nada. Só ficou olhando muito sério para a mãe, e depois correu para o seu quarto, gritando: — É mentira, mãe! Isso é a maior mentira!! Na hora do jantar, vendo que o filho nem tocava na comida, dona Dora tentou acalmá-lo: — Tico, não fique assim! A Lia é uma menina feliz! Ela mudou para a nossa rua há pouco tempo. Ela vai à escola, brinca e tem muitos amigos! Você não precisa ficar triste por ela! Naquela noite, o Tico não conseguiu dormir direito. Ficou rolando na cama, embolando os lençóis e pensando: “É mentira, é mentira!”. [...] — Oi, Lia! Eu demorei um pouco porque estava lá no sofá, pensando. — Oi, Tico! Eu estava quase indo embora, achando que você não ia aparecer! — a Lia disse, sorrindo. O Tico ficou mudo por alguns instantes, se sentindo horrível. Ele tinha planejado fazer uma coisa e, antes de fazer, já estava arrependido. Tinha planejado inverter a brincadeira para ver se era verdade mesmo o que sua mãe tinha dito. Ia pedir à Lia que apontasse as figuras das nuvens para ele. Mas, no momento em que ela sorriu, virando o rosto na direção dele, o Tico percebeu que os olhos dela olhavam, mas não viam. — Tico, você está aí? — a Lia perguntou, diante do silêncio dele. — Eu ainda estou aqui, sim — ele disse, com a voz meio travada. [...] — Eu... eu quero saber por que você nunca me disse que não enxerga — ele, disse, com um fio de voz. — Ah, as figuras? — ela sorriu. — É, as figuras das nuvens — ele confirmou. — Porque eu enxergo as figuras, ora... Só por isso. — Mas você não é cega? — o Tico perguntou, sem entender nada. — Eu sou cega, sim, e daí? Você, que não é cego, não demorou um tempão para enxergar que eu sou cega? Então... Eu só não enxergo com os olhos de fora, mas posso enxergar tudo o que quiser com os olhos de dentro: com as minhas mãos, com a minha imaginação... Eu juro que enxerguei todas as figuras que você me mostrou, Tico! — Puxa, que bom Lia! Eu pensei que você tinha mentido para mim! — O Tico suspirou aliviado e feliz. — [...] Lô Galasso. Mãos de vento e olhos de dentro.
São Paulo: Scipione, 2015. p. 14, 16, 18 e 20.
O menino ficou triste quando: